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Operação Lava Jato enfrenta fila de milhares de processos nos estados

Redação OitoMeia - 27 de março de 2017 às 10:18
Rodrigo Janot, procurador-geral da República, remeteu 211 pedidos de declínio de competência a outras instâncias (Foto: Jorge William / Agência O Globo)

A partir das delações da Odebrecht, a Procuradoria-Geral da República enviou 211 pedidos de declínio de competência a outras instâncias judiciais. São casos de pessoas suspeitas que não são julgadas pelo Supremo Tribunal Federal. Essas solicitações se somarão, nos estados, a outros milhares de procedimentos de combate à corrupção conduzidos pelo Ministério Público Federal (MPF) e também pelos estaduais (MPE). Isso significa que seguir o ritmo da Lava Jato — com priorização dos casos — dependerá de uma decisão política.

Apenas nas 27 unidades do (MPF) pelo país, para onde devem ser encaminhados os casos com indícios de suspeita de desvios de recursos da União, tramitam hoje pelo menos 23,7 mil procedimentos na área de combate à corrupção, segundo levantamento da PGR. A maior parte diz respeito a inquéritos civis (10,7 mil) e criminais (9,7 mil).

No entanto, os braços especializados em tratar da área não são tão numerosos. Criados nesta década para tornar mais contundente a ação contra malfeitos nos estados, os Núcleos de Combate à Corrupção (NCC) dos MPFs dispõem de 93 procuradores, dos quais apenas 38 estão dedicados exclusivamente à causa, segundo levantamento do GLOBO com os órgãos. A assessoria da PGR afirma que, na prática, o exército anticorrupção seria maior, “próximo de 500”, uma vez que procuradores no interior e de outras áreas do MPF eventualmente recebem casos dessa área.

A diferença da atuação por meio do NCC é considerável, segundo os próprios procuradores. O núcleo permite que o mesmo integrante do MPF atue na investigação cível e também na criminal, na formalização de acusações, acompanhando as instruções processuais, participando das audiências judicais e recorrendo em caso de necessidade. Para especialistas, tal condição proporciona maior intimidade com os detalhes dos casos e tende a tornar sua atuação mais eficaz. Atualmente, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo e PGR têm forças-tarefa para atuar em casos da Lava-Jato, o que representa uma soma de 34 procuradores à lista de especializados no tema. No entanto, apenas no Paraná e na PGR a atuação em processos da Lava-Jato é exclusiva.

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SÓ 7 FEDERAÇÕES TÊM GRUPOS CONRA CORRUPÇÃO

Episódios relatados pelos delatores não relacionados a malfeitos com verba federal serão encaminhados aos Ministérios Públicos estaduais, que têm estrutura diferente daquela à disposição dos MPFs. Atualmente, apenas sete estados possuem grupos destinados a apurar exclusivamente crimes de corrupção, segundo levantamento do GLOBO. Em outras 15 unidades da federação, casos são encaminhados a promotores que atuam em núcleos contra o crime organizado — e que, portanto, também investigam facções criminosas — ou a promotorias que zelam pelo Patrimônio Público.

Realidade cada vez mais comum na Justiça Federal, as varas especializadas em lavagem de dinheiro (a mais famosa é a 13ª Vara Federal de Curitiba, liderada pelo juiz Sérgio Moro) não fazem parte do cotidiano estadual. De acordo com o levantamento, nenhum dos estados consultados possui um juiz estadual que julgue apenas esse tipo de crime. Na investigação do cartel de trens de São Paulo, por exemplo, cada uma das oito denúncias contra empresários que fraudaram licitações foi para um juiz diferente.

Isso significa que os casos da Lava-Jato podem cair em varas que julgam processos de roubo e tráfico de drogas, por exemplo. Com isso, maior é o risco de juizes terem entendimentos conflitantes, principalmente em relação à adoção de medidas como prisão preventiva ou bloqueio de bens.

Para promotores estaduais, atuar exclusivamente nisso é praticamente impossível. Embora não exista levantamento específico sobre casos de corrupção, a última edição do estudo Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aponta que, para cada novo processo aberto na Justiça Federal, outros cinco, em média, surgem na Justiça Estadual. Nas unidades da federação, ministérios públicos precisam dar conta de casos de homicídios, crimes contra a Saúde pública e a Educação. Apesar disso, promotores argumentam que os MPEs têm estruturas aptas a lidar com processos decorrentes da lista de Janot.

— Muitos estados têm grupos que investigam crime organizado ou crimes cometidos por prefeitos, além de setores de inteligência para dar apoio na área de quebras de sigilo, escutas. Isso permite que a investigação esteja sempre um passo à frente do investigado, ainda mais quando ele é alguém poderoso — afirma o promotor Denis Bimbati, do Centro de Inteligência do Ministério Público de Goiás.

Como exemplo de atuação no estado ele cita a Operação Tarja Preta, que investigou, em 2013, 59 pessoas, entre elas 11 prefeitos acusados de fraudar licitações na área da Saúde para beneficiar empresas que financiaram suas campanhas, esquema que movimentou R$ 15 milhões em 2012. Embora algumas denúncias tenham sido oferecidas, nenhum acusado foi condenado, até agora, à prisão.

Infelizmente, a legislação ainda é mais preocupada com o patrimônio privado do que com o público. O sujeito rouba um botijão de gás e está sujeito a uma pena de reclusão (cumprida em regime fechado), enquanto quem frauda uma licitação de milhões tem uma pena de detenção (que prevê regimes semiaberto ou aberto).

No Rio, dois promotores trabalham exclusivamente no Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc), onde cuidam atualmente de 40 procedimentos. Não há garantia de que investigações originadas pelas delações de ex-executivos da Odebrecht fiquem sob responsabilidade desses grupos. No Distrito Federal e no Tocantins, a falta de núcleo específico não impediu que casos de corrupção fossem investigados. Cinco deputados foram denunciados no DF por suspeita de desviarem sobras orçamentárias em 2015; no Tocantins, uma força-tarefa com o procurador-geral entre os integrantes investiga o superfaturamento de 170 obras viárias, que consumiu R$ 600 milhões.

PRESCRIÇÃO DE CRIMES

A distribuição de processos pelo país coloca a Lava-Jato frente a frente com o mesmo problema de dez anos atrás: no auge da Operação Banestado — que desvendou um esquema bilionário de evasão de divisas para paraísos fiscais —, processos envolvendo centenas de beneficiários e doleiros foram distribuídos aos estados, pois Curitiba não dava conta de processar todos os casos.

O resultado foi trágico: a maior parte prescreveu e réus ficaram impunes. Para a força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, o momento atual é diferente porque há maior conscientização da sociedade como um todo, e também de agentes do MPF, que já se engajaram no trabalho de ouvir ex-executivos da Odebrecht nos depoimentos preliminares à homologação da delação. A coordenação das investigações por parte da PGR também é citada como uma vantagem dos novos tempos.


Redação OitoMeia