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Entretenimento

Salve Rainha: carnaval em antigo sanatório de Teresina divide opinião pública

Edrian Santos - 3 de fevereiro de 2017 às 15:43

O coletivo Salve Rainha está envolvido em mais uma polêmica. Não mais com nus em um espaço público. Agora, a intenção é realizar uma intervenção com temática carnavalesca no antigo Sanatório Meduna, fechado desde 2010, depois de 56 anos de funcionamento. A iniciativa chamou a atenção de internautas, que alegaram desrespeito à memória de quem passou por algum procedimento psiquiátrico no local. Também há quem defenda o evento, explicando a necessidade de resignificar o que antes era considerado um espaço para tratar “loucura”.

Salve Rainha realiza temporada de Carnaval em sanatório e internautas chamam atitude de desrespeitosa (Foto: Reprodução Facebook)

O OitoMeia, durante a manhã desta sexta-feira (03/02), foi consultar alguns dos envolvidos na polêmica. Anônimos expuseram o que acham do assunto, órgãos públicos se posicionaram e o Salve Rainha confirma a chamada “Temporada de Carnaval 2017 – Rainha das Águas” no então espaço Meduna, por meio de um evento no Facebook criado pela página oficial do coletivo.

“Odoya! No primeiro domingo da Temporada de Carnaval 2017 do Salve Rainha, vamos celebrar com a Rainha das Águas, uma grande homenagem à Iemanjá Deusa Brasileira dos Mares, do Azul, de tudo e de todos. Dia de festa e muito amor-respeito-interferência-insistência-resistência. Vamos resinificar o espaço do antigo Sanatório Meduna, levar alegria e cultura com muito respeito à sua história. Venham leves e de coração feliz para fazer desse domingo inesquecível!”, diz trecho da descrição do evento criado pelo Salve Rainha no Facebook.

Evento criado na página oficial do Salve Rainha afirma que intenção do grupo é resinificar o antigo sanatório (Reprodução Facebook)

Numa publicação feita às 13h38 da última quinta-feira (03/02), o grupo explica a funcionalidade e o objetivo da ocupação do prédio em questão. Muitos comentários ficaram divididos entre concordar ou não com a “festa” carnavalesca no Meduna.

Teve internauta que acusa o grupo de “fetichista” e que o local não seria apropriado para uma discussão antimanicomial. Outro é mais incisivo e diz que o Salve Rainha só visa arrecadar dinheiro. Em resposta, o coletivo e admiradores refutam na alegação de que o Salve Rainha não tem fins lucrativos e valoriza o patrimônio histórico e cultural de Teresina.

Salve Rainha responde internautas e diz que grupo não tem fins lucrativos e visa valorizar patrimônio histórico e cultural de Teresina (Reprodução Facebook)

“INTERVENÇÃO DESNECESSÁRIA”

Estudante Ismael Costa acredita que festa de carnaval é desnecessária no antigo Sanatório Meduna (Foto: Reprodução Facebook)

Ismael Costa é um estudante do curso de Engenharia Civil que se diz acreditar nas propostas de reutilização de espaços públicos abandonados da capital, de acordo com diretrizes do Salve Rainha. Por outro lado, ele questiona a forma como o coletivo vai tratar sobre o que acontecia no manicômio, encontrando-se hoje nas proximidades do Shopping Rio Poty.

“Não concordo de jeito nenhum com o que está acontecendo. Acho que lá é um local onde deveria haver respeito pelo que já ocorreu, como torturas e mortes, por se tratar de um local extremamente violento. Acho que fazer uma festa, ainda mais com marchinhas de carnaval, é totalmente desnecessário”, diz o estudante ao OitoMeia.

“O Salve Rainha é um coletivo de ocupação e ele tem como ocupar o Meduna de forma saudável, mostrando para a população o que aconteceu lá e conscientizando. Acho que isso pode ser feito sem fazer uma festa. Deveria ser feito sim uma ocupação, mas não no sentido de festa, de folia. A ocupação deveria acontecer no sentido de conscientizar as pessoas”, conta Ismael.

INTERVENÇÃO LEGÍTIMA

Baseado na Política Nacional de Saúde Mental, o psicólogo Leonardo Sales destaca que a iniciativa do Salve Rainha é uma proposta de desinstitucionalização da loucura, de forma a extinguir espaços manicomiais, tanto no aspecto ideológico como em questões físicas de um hospício. “O Meduna ele não existe mais. Ele não foi um lugar feliz nem para os moradores [usuários] nem para a família. Ele foi um lugar de muita dor e sofrimento”, analisa.

Psicólogo Leonardo Sales defende intervenção do Salve Rainha no antigo sanatório e diz que carnaval vai resinificar espaço (Foto: Reprodução Facebook)

Nessa linha de raciocínio, já que não existe mais o espaço físico para o tratamento de “doentes” considerados loucos, o especialista aponta a legitimidade de o Salve Rainha ocupar o espaço com a proposta carnavalesca. “A intervenção do coletivo é tirar essa ligação de que o Meduna é um espaço de produção de doença e criar um espaço de produção de vida, onde eu possa trazer arte, cultura e movimento. Essa é a proposta do Salve Rainha”, conclui Leonardo.

REFERÊNCIA CULTURAL

Em contato com o Salve Rainha, o coletivo informou que o grupo se articula para fazer uma nota de esclarecimento, com divulgação ainda nesta sexta-feira (03/02). O OitoMeia também ouviu a Prefeitura Municipal de Teresina (PMT) e a Secretaria Estadual de Cultura (Secult), já que ambas foram creditadas no apoio do evento.

A PMT esclareceu que o apoio ao Salve Rainha acontece de forma geral e não a um evento específico. Como o Meduna não é de responsabilidade do Município, a prefeitura não pode se pronunciar oficialmente. A Secult destaca que apoia movimentos culturais e que o Salve Rainha é uma referência para a produção cultural local. Ainda segundo a pasta, a “ocupação de espaços abandonados sempre fez parte da filosofia do movimento”.


Edrian Santos